Quem são os brasileiros que não têm nenhum documento?
Quase três milhões de pessoas não têm sequer um documento no Brasil, segundo o último levantamento do IBGE. Isso significa que elas não existem oficialmente e nem são reconhecidas como cidadãs.
Sem Certidão de Nascimento, RG, CPF e Título de Eleitor, elas são empurradas para condição de indigente, pois nunca foram à escola. Não comemoram aniversário, porque desconhecem o dia que nasceram.
Nossos repórteres viajaram pelas regiões Sudeste, a mais rica do país, e Nordeste, considerada a mais pobre, para mostrar como é o dia a dia de quem vive às sombras do poder público.
Serra do Inácio - PI
Genalda Maria de Jesus acha que tem 17 anos, mas não tem certeza, pois não possui nenhum documento. Seus filhos também não têm documentação. Como estão sem registro, a mãe ainda não escolheu o nome completo dos meninos. “Para fazer o registro, eu preciso do meu documento. Só que eu nunca tive”, lamenta.
“Pessoas como Genalda não existem para o mundo cível. Quem não tem documento, não pode ser inserido nas políticas públicas de governos. Elas vivem à margem da sociedade”, diz Karla Andrade, defensora pública do estado do Piauí.
São Paulo - SP
Stephani também não é documentada. Quando criança, se perdeu nas ruas da capital paulista e encontrou refúgio na cracolândia, no centro da cidade. Passou 10 anos vendendo drogas e se prostituindo em troca de pedras de crack. A partir daí, a jovem passou a existir, mas apenas para o sistema carcerário. “Eu não recebi nenhuma visita, não sabia o endereço da minha casa, não tinha pra quem recorrer. O número do RG criminal é o único registro que eu possuo na vida”, revela.
“São invisíveis aos olhares do Estado e até de outras pessoas. Elas não têm referência sobre elas, o que no século XXI, na era da informação, constitui um absurdo completo”, avalia Marcelo Neri, economista da FGV-Rio.
Rio de Janeiro - RJ
A Certidão de Nascimento é o primeiro passo para comprovar nossa existência. Nela, tem informações que vamos carregar para o resto da vida. Por não ter esse documento, Gisele perambula com o namorado pelas ruas da 'Cidade Maravilhosa' e se pergunta a todo momento: quem sou eu?
A jovem nunca tomou vacina, não sabe ler nem escrever e jamais foi ao médico. “Gostaria de sair dessa vida de sofrimento. Arrumar uma casa. Ser reconhecida como pessoa”, espera Gisele. Só no estado do Rio de Janeiro, mais de 24 mil pessoas não têm documentos, segundo o IBGE.
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